Já dá para perceber a pegada do filme logo de cara, nas primeiras cenas, e o que se percebe é uma superfície de normalidade que parece esconder algo de bizarro, de obscuro, que em algum momento vai irromper.
Isso fica claro logo no primeiro terço do filme, quando há uma cena de suspense e susto no meio de toda aquela sequência de nascimento do primeiro amor, flerte e romance. As coisas parecem não se encaixar, logo nesse início. Temos a impressão de estarmos assistindo a um coming of age tradicional, um romance padrão adolescente, talvez. Porém, ao mesmo tempo, o filme vai tomando rumos inesperados, e de supetão algo sinistro se insinua, e o filme vai crescendo em tensão ao passo que as insinuações desse sinistro vão se tornando mais correntes, até o momento em que o sinistro sobe à superfície e domina a cena.
Um filme de roteiro preciso e precioso. Se passa quase todo em um mesmo ambiente, e se fortalece nos diálogos bem construídos e nas viradas inesperadas, impregnadas de mistério, que se desenvolvem sem forçar a barra, sem causar incredulidade, pelo contrário. O desenvolvimento da trama se dá de forma instigante e natural, e por isso mesmo o filme se utiliza de técnicas clássicas, como o uso regular do campo e contracampo clássico para encenar os diálogos. Mas o clássico vai se imbuindo do moderno, quando a trilha sonora parece dissonante com a cena encenada, trazendo informações extra diegéticas que auxiliam na criação de um clima sinistro e misterioso. A narrativa também segue rumos clássicos e modernos, trazendo à tona temáticas mais exploradas no cinema contemporâneo, como relações amorosas abusivas, e outras mais clássicas, como abuso de poder. Nessa mescla reside a singularidade da obra, que pode causar tamanho estranhamento a ponto de prejudicar a experiência para alguns. Não à toa fiquei surpreso com a quantidade de comentários negativos a respeito da obra. Cada um na sua.
Eu entrei na onda, curti esta mescla que acaba por dar uma tonalidade esquisita à encenação, e posso dizer que o filme foi uma grata surpresa.
Matéria escrita por João Marcos Albuquerque durante a cobertura da 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
Roost
Direção: Amy Redford
Roteiro: Scott Organ
EUA - 2022 - 1h 25min
Avaliação:
3,5/5
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